Sobre arte e educação

O ensino da arte e a formação musical

Por André Araújo Lima 25/06/2023

Para este professor, é fundamental, a princípio, o conhecimento destas diferentes e polifônicas origens para fornecer aos estudantes um escopo amplo não apenas da história da música. Mas também contribuir para a sua educação musical, amparada menos pelo adestramento técnico e muito mais pela apreciação, fruição, experimentação e produção musical no espaço da escola. 

Descolonizar a formação musical

Importa, deste modo entender, de saída, qual o contexto da formação da música brasileira para então compreender sua importância da educação musical para o ensino da Arte. Podemos considerar que a formação da música brasileira é atravessada pela invasão portuguesa em meados do século XVI. Desse contato drástico surgiram, pelas mãos dos jesuítas, as primeiras iniciativas de uma educação musical, fortemente influenciados pelos moldes católicos da Europa ocidental.

Apesar da forma incivilizada pela qual portugueses aportaram no território que viria a se tornar o Brasil, não podemos desconsiderar a importância desta cultura para a formação pioneira de uma educação musical. Sua relevância para a criação de uma série de estilos e movimentos musicais foi de fundamental posição no cenário da música brasileira. Este movimento se ampliou ainda mais com a vinda da família real para o país. 

Antecedentes da formação musical no Brasil

No período histórico seguinte, a república, experimenta-se uma independência em relação à igreja e onde podemos considerar, de acordo com Corrêa (1975), o nascimento de uma música genuinamente brasileira. Destacam-se nomes como Glauco Velasques, Francisco Mignone, Alexandre Levy, Lorenzo Fernandes, Luciano Gallet, Camargo Guarnieri e Heitor Villa-Lobos. 

A partir desse período vemos o florescer de uma série de ritmos, estilos e artistas ganhado destaque na cena musical brasileira. Surge a música popular brasileira e suas diversas ramificações, estas advindas a partir do lundu e da modinha.

As transformações tecnológicas popularizaram ainda mais a MPB, o rádio, o vinil e anos depois com a televisão. Os festivais de música dos anos 60, exibidos em rede nacional na TV, marcaram a memória do público e abriram muitas portas para artistas hoje consagrados, como Caetano Veloso e Gilberto Gil. Estava sendo forjada a identidade da música brasileira, marcada pela miscigenação dos povos e a contribuição das diversas origens de estilos, ritmos, bases melódicas, instrumentos e técnicas. 

Aspectos legais

Seria, portanto, ingenuidade desconsiderar a diversidade musical brasileira apartada do espaço escolar. Resta, nesse sentido, compreender como oportunizar aos estudantes um processo de musicalização que seja inclusivo, emancipatório e que leve em conta as vivências musicais dos estudantes em seu processo formativo na escola.

As transformações que ocorrem no mundo contemporâneo e nas práticas pedagógicas de professores, assim como aspectos legais e marcos normativos, a exemplo da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), e em especial para a Lei n. 11.769, que altera a LDB. 9.394/96 no seu artigo 26, propondo a obrigatoriedade do ensino de música na Educação Básica.


A musicalização como estratégia pedagógica

Um conceito que merece destaque, a musicalização, pode nos favorecer a compreensão sobre a pertinência de estudo e preparo pedagógico do professor de arte para que este seja capaz de sair do improviso e de práticas que não atendam, por exemplo as 10 competências essenciais preconizadas no texto da BNCC para a Educação Básica.

A musicalização não se trata de uma experiência musical acrítica e desvinculada de intencionalidade. De acordo com Regina Luzia Marcondes de Arruda Lima (2013), no livro Música para Educadores,

"A musicalização é um trabalho que favorece uma rica experiência e uma vivência com as estruturas musicais, além, é claro, de facilitar as convivências entre as pessoas, desenvolvendo as expressões, os pensamentos e as emoções por meio de sua linguagem musical. A musicalização torna o indivíduo ou a criança receptível ao mundo sonoro, respondendo de uma maneira musical. (LIMA, 2013, p. 44)."

Se o processo de musicalização, como cita Lima, é um trabalho que deve proporcionar o desenvolvimento de uma sensibilidade musical a partir da linguagem da música. Devemos nos perguntar se este processo prescinde da aquisição de uma técnica musical específica para a concretização de tais processos.

Se a música é uma linguagem natural do ser humano, onde a musicalização atua justamente no resgate desta vivência natural. Percebe-se que o domínio técnico e instrumental teria pouca importância diante de um processo mais amplo e profundo como o da musicalização. 

Formação sensível através da música

Sabemos que a Música na escola não visa a formação de artistas, de músicos e muito menos virtuoses. Acreditamos que ela fará uma vivência e entendimento da linguagem musical, desenvolvendo, assim, os canais sensoriais, melhorando a maneira de expressar as emoções, aumentando a cultura geral e a formação integral do cidadão inserido na sociedade em que vive. (LIMA, 2013, p. 47).

A garantia de que estudantes e professores irão conseguir êxito nos processos de musicalização na escola não perpassa o domínio técnico sobre a música. Antes se ancoram na ampliação do repertório musical e pela fruição do belo em diálogo com as vivências compartilhadas a partir de uma cultura musical. 

É preciso engajar professores de arte

Pensemos a prática pedagógica pouco inclusiva encenada por um professor de arte. Importa observar quais aspectos de sua prática se distanciam de uma implicação com o fazer pedagógico.

É preciso que se contemple as concepções de uma musicalização entre os estudantes no ambiente da escola. Essa concepção é apontada nos conceitos elencados anteriormente por Regina Luzia Marcondes de Arruda Lima.

Pensemos que a prática defendida por este professor, ao limitar as ações dos estudantes apenas a escuta e ao debate, deixa de considerar outros importantes aspectos do processo de musicalização. Seus alunos não podem abrir os olhos e devem ficar em silêncio durante a escuta de uma música infantil. A turma é dos primeiros anos do ensino fundamental.

Desse modo, estudantes terão uma percepção limitada sobre a ressonância musical e os seus efeitos sobre seus corpos e dos outros colegas ao permanecerem todos de olhos fechados. Eles nunca saberão quais reações seus colegas tiveram ao ouvir determinada música. Esta capacidade de compartilhar percepções é um componente fundamental no processo de musicalização para crianças e adolescentes. 

O desafio é a criação do diálogo ativo

Outro ponto que merece atenção ao analisar a prática pedagógica deste professor é o fato de ter obrigado seus estudantes a permanecerem em silêncio. Um fator de interesse para a apreciação musical é a capacidade de memorização dos sons. Para que isso ocorra é indispensável a repetição dos sons escutados.

A criança repete sons com a boca na tentativa de imitá-los e consegue memorizar sonoridades peculiares no seu dia a dia. Se a música é uma linguagem natural do ser humano seria incoerente limitar o aprendizado à mera escuta passiva.

Constituir um repertório musical vai muito além da assimilação passiva de uma música. É nessa constituição plural que a musicalização atinge seu papel social. Criar um espaço de diálogo entre os sujeitos, não apenas no âmbito da música, mas também na fala.



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